- Uiliam Grizafis
- 14 de nov. de 2020
- 3 min de leitura

Proclamação da República, de Benedito Calixto Wikimedia Commons
Imagem de Aventuras na História. Disponível em: https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/galeria/benedito-calixto-quadro-proclamacao-da-republica.phtml Acesso em 06 de Novembro de 2020.
José Murilo de Carvalho é um historiador brasileiro, imortal da academia brasileira de letras e no seu livro, “A Formação das Almas”, ele escreve sobre o imaginário da República no Brasil. Posto isso, quero começar a falar sobre o assunto que foi tratado no capítulo 4, que tem como título: “República-mulher entre Maria e Marianne”. O autor começa o capítulo falando que um dos elementos marcantes do imaginário republicano francês foi o uso da alegoria feminina para representar a República. Antes da revolução, a figura que transcendia era a do rei, morto o monarca, novas figuras precisaram ser criadas. A figura feminina teve grande destaque na simbologia cívica francesa, conta-se que a inspiração veio de Roma onde a mulher já era símbolo de liberdade. Não é de hoje que se necessitou apoderar-se do imaginário do povo e a melhor forma para que isso acontecesse foi através dos símbolos e da arte. Os republicanos brasileiros de orientação francesa, tinham muitas imagens para se inspirar. A imprensa periódica da época, as que eram simpáticas ao movimento republicano, fez com que as representações femininas viessem a público, como se pode ver na charge de Angelo Agostini na Revista Ilustrada de 9 de junho de 1888, que mostra os senhores de escravos pedindo indenização à República, na imagem, homens estão atrás de uma mulher a reclamar. Pereira Neto, também reproduziu a imagem feminina como a de 14 de dezembro de 1889. Nessa, a República brasileira confraterniza com a argentina e ambas são representadas por mulheres.
A República não teve apenas seus apoiadores, e no começo do novo regime, não demorou muito para que caricaturistas passassem a ridicularizá-la, usando a mesma alegoria. José Murilo de Carvalho nos conta que “é certo que os inimigos da República fizeram o mesmo na França” e a mulher virgem ou heroica dos republicanos era facilmente transformada em prostituta. A frase “Esta não é a República dos meus sonhos” refletiu o desapontamento existente. Já na primeira década começaram as críticas como a de 25 de novembro de 1895 onde A. A. mostra a República representada por uma mulher abatida montada num burrico, voltada para trás, enquanto as outras repúblicas americanas galopam para o progresso. Em O Malho de 15 de novembro de 1902, C. do Amaral mostra o contraste entre a República dos sonhos de 1889 (ano do golpe) e a de 1902. A primeira é representada por uma jovem inocente; a segunda, por uma mulher madura, de olhar debochado, soprando a fumaça de um cigarro. No ano seguinte, Raul, também em O Malho, representa a República como uma mulher retida no leito, cujo marido, ao lado, comenta que já se vão treze anos e ela ainda não se levantou. J. Carlos, em O Filhote de 11 de novembro de 1909, exibe uma República prostituída, envolvida numa orgia com os políticos. Em o Fon-Fon de 13 de novembro de 1913, a República é retratada como envelhecida. Vasco Lima, em O Gato de 22 de março de 1913, mostra uma caricatura de uma mulher com seios exageradamente vastos, onde o artista justifica: É a nudez crua da verdade. A República dá de mamar a tanta gente!”. Em vez de mãe, a República é a ama de leite, vaca leiteira, que tem de alimentar políticos e funcionários. José Murilo comenta que essa foi a versão brasileira do quadro de Daumier. A República-mãe, protetora, alimentadora. Vasco Lima abrasileirou o quadro. As referências ao novo regime não foram limitadas somente nas representações ilustrativas, a literatura caminhava na mesma direção. José Murilo nos conta que o boêmio Neiva, de Fogo Fátuo, de Coelho Neto, não se conforma com a proclamação da República e com as medidas do governo provisório e não gostava do regime presidencialista.
Essas e outras informações, caro leitor, encontramos no livro mencionado acima e o encorajo a adquiri-lo. O fato da nossa história ser olvidada, faz com que o brasileiro odeie o Brasil. Nessa série de artigos, procuro trazer à luz aquilo que está na escuridão, para que conheçamos e recordamos nossa história. A história política no Brasil não se trata só de governos, que foram ruins e se entregaram aos motivos de chacotas como temos visto até no nosso contemporâneo. Se trata também de brasileiros que construíram a nossa nação, que lutaram pela independência e pela causa abolicionista e venceram. Muito se fala do rompimento que o golpe republicano trouxe, rompimento de legados que haviam sido constituídos. A pergunta que lhe faço, paciente leitor, é: Que tipo de legado a República nos deixou e que tipo de independência e liberdade temos hoje?